segunda-feira, 31 de maio de 2010

O gato maltês




Era uma vez

Um gato maltês

Tocava piano

E falava francês

Queres que te conte outra vez?


Era uma vez

Um gato maltês

Saltou-te às barbas

Não sei que te fez

Queres que te conte outra vez?


Era uma vez

Um gato maltês

Tocava piano

Falava françês

A dona da casa

Chamava-se Inês

O número da porta era o trinta e três!

Queres que te conte outra vez?


Era uma vez

Uma galinha pedrês

E um galo francês

Eram dois

Ficaram três…

Queres que te conte outra vez?
(A fotografia é da minha gata maltesa, a Tricot, ex-pendura e ex-fera selvagem, agora a "minha mais nova" e melga de meiga. Não fala francês e nem sequer sabe miar como um gato que se preze... Tem qualquer coisa de Nina Simone no miado! Não toca piano, até porque não tenho nenhum em casa... mas sabe abrir portas e tem ataques de cleptomaníaca! Quando chegou (em versão mini) gostava de encarnar uma cobra cuspideira em pleno ataque e ainda não estava há meia-hora na minha casa, já tinha trepado através do esquentador. Sim, através, ou seja, por dentro do mesmo!
Actualmente, o grande perigo é quando ando pela casa a meio da noite...um gato preto, no escuro, a tentar dar turrinhas nas minhas pernas é como uma rasteira feita por um fantasma invisível! Enfim... é a minha gata portátil (os outros são a "orca" e o "elefante"), de rabo em forma de gancho e cuja pupila esquerda nunca fica totalmente contraída, como aliás, dá para ver na fotografia. É a minha enfant terrible!)

sexta-feira, 21 de maio de 2010

terça-feira, 11 de maio de 2010

Jesus- in Bichos por Miguel Torga

Comiam todos o caldo, recolhidos e calados, quando o menino disse:
-Sei um ninho!
A Mãe levantou para ele os olhos negros, a interrogar. O Pai, esse, perdido nos alheamento costumado, nem ouviu. Mas o pequeno, ou para responder à Mãe, ou para acordar o Pai, repetiu:
-Sei um ninho!
O velho ergueu finalmente as pálpebras pesadas, e ficou atento, também.
A criança, então, um tudo-nada excitada, contou. Contou que à tarde, na altura em que regressava a casa com a ovelha, vira sair um pintassilgo de dentro dum grande cedro. E tanto olhara, tanto afiara os olhos para a espessura da rama, que descobrira o manhuço negro, lá no alto, numa galha.
A Mãe bebias as palavras do filho, a beijá-lo todo com a luz da alma. O Pai regressou ao caldo.
Mas o menino continuou. Disse que então prendera a cordeira a uma giesta e trepara pela árvore acima.
De novo o Pai levantou as pálpebras cansadas, e ficou tal e qual a Mãe, inquieto, com a respiração suspensa, a ouvir.
E o pequeno ia subindo. O cedro era enorme, muito grosso e muito alto. E o corpito, colado a ele, trepava devagar, metade de cada vez. Firmava primeiro os braços; e só então as pernas avançavam até onde podiam. Aí paravam, fincadas na casca rija.
A subida levou tempo. Foi preciso descansar três vezes pelo caminho, nos tocos duros dos ramos. Por fim, o resto teve de ser a pulso, porque eram já só vergônteas as pernadas da ponta.
Transidos, nem o Pai nem a Mãe diziam nada. Deixavam, apavorados, mudos, que o pequeno chegasse ao cimo, à crista, e pusesse os olhos inocentes no ovo pintado. O ninho tinha só um ovo.
Aqui, o menino fez parar o coração dos pais. Inteiramente esquecido da altura a que estava, procedera como se viver ali, perto do céu, fosse viver na terra, sem precisão dos braços cautelosos agarrados a nada. E ambos viram num relance o pequeno rolar, cair do alto, da ponta do cedro, no chão duro e mortal de Nazaré.
Mas a criança, apesar de mostrar, sem querer, de que todo se alheara do abismo sobre que pairava, não caiu. Acontecera outra coisa. Depois de pegar no ovo, de contente, dera-lhe um beijo. E, ao simples calor da sua boca, a casca estalara ao meio e nascera lá de dentro um pintassilgo depenadinho.
E o menino contava esta maravilha com a sua inocência costumada, como quando repetia a história de José do Egipto, que ouvira ler a um vizinho.
Por fim, pôs amorosamente o passarinho entre a penugem da cama, e desceu. E agora, um nada comprometido, mas cheio de felicidade, sabia um ninho.
A ceia acabou num silêncio carregado. Só depois, à volta do lume quento do cepo de oliveira em brasido, é que os pais disseram um ao outro algumas palavras enigmáticas, que o pequeno não entendeu. Mas para quê entender palavras assim? Queria era guardar dentro de si a imagem daquele passarinho depenado e pequenino. Isso, e ao mesmo tempo olhar cheio de deslumbramento os dedos da Mãe, que, alvos de neve, fiavam linho.
E tanto se encheu da imagem do pintassilgo, tanto olhou a roca, o fuso, e aqueles dedos destros e maravilhosos, que daí a pouco deixou cair a cabeça tonta de sono no regaço virgem da Mãe.

Quixote - Ópera Bufa em cena no Teatro da Trindade

"Mesmo quando os cabelos ficam brancos, a cabeça ainda brilha, ainda luta, ainda sonha. Mesmo quando o corpo envelhece, a mente ainda dança, ainda canta, ainda conquista."

Destas conquistas da alma fala a peça Quixote, em cena no Teatro da Trindade até 13 de Junho, pela criação do Teatro O Bando, com composição musical de Jorge Salgueiro e encenação do grande João Brites, partindo do texto Vida do Grande D. Quixote de La Mancha e do Gordo Sancho Pança de António José daSilva, O Judeu.

Com carácter cómico, mas tratando de um tema tão sensível como o envelhecer, apresenta-se um excelente espectáculo em que cadeiras-de-rodas e andarilhos vibram como barcos e aviões, descem até ao Inferno e ascendem até Apolo! Numa versão feminina de um conto para todos familiar, permite-nos rir enquanto pensamos na idade a que todos desejamos chegar, mas que todos esperamos que ainda demore...

"Loucura? Loucura seria adormecer..."

E pela descrição feita...obviamente que adorei! (Qualquer semelhança com o meu dia-a-dia profissional sui generis...enfim...)